sábado, 28 de fevereiro de 2009

"O Homem, as Viagens" - Meu ponto de vista sobre:


Como  Drummond aborda o problema da natureza humana e a importância do texto literário, que transcende o lugar e o tempo no qual foi concebido

“O homem, bicho da terra tão pequeno
chateia-se na terra
lugar de muita miséria e pouca diversão...”

O homem quando faz descobertas acerca de sua própria identidade torna-se incansável em busca de algo maior.
A miséria não é apenas material e sim humana. Nesse momento, começa sua inquietude, conhecer novas terras, inventar novas formas, buscar o desconhecido e se inebriar com o novo.
Após saborear o desconhecido novo, enjoa-se, parte para a próxima busca, e assim sucessivamente. O novo torna-se velho e a busca recomeça.
O auto-conhecimento é a “dificílima” viagem, é a melhor maneira de conhecer seus próprios sentimentos, vontades e sua realidade.

O texto literário exerce um fascínio sobre os leitores, não importa o lugar e o tempo.
É sempre atual e trabalha com questionamentos humanos, as descobertas, a inquietude, os problemas sociais e políticos. De alguma maneira, transforma, acrescenta e torna crítico seu leitor.

O Homem, as Viagens

O homem, bicho da Terra tão pequeno

chateia-se na Terra

lugar de muita miséria e pouca diversão,

faz um foguete, uma cápsula, um modulo

toca para a Lua

desce cauteloso na Lua

pisa na Lua

planta bandeirola na Lua

experimenta a Lua

coloniza a Lua

civiliza a Lua

humaniza a Lua.



Lua humanizada: tão igual à Terra.

O homem chateia-se na Lua.

Vamos para Marte — ordena a suas máquinas.

Elas obedecem, o homem desce em Marte

pisa em Marte

experimenta

coloniza

civiliza

humaniza Marte com engenho e arte.


Marte humanizado, que lugar quadrado.

Vamos a outra parte?

Claro — diz o engenho

sofisticado e dócil.

Vamos a Vênus.

O homem põe o pé em Vênus,

vê o visto — é isto?

idem

idem

idem.


O homem funde a cuca se não for a Júpiter

proclamar justiça junto com injustiça

repetir a fossa

repetir o inquieto

repetitório.



Outros planetas restam para outras colônias.

O espaço todo vira Terra-a-terra.

O homem chega ao Sol ou dá uma volta

só para tever?

Não-vê que ele inventa

roupa insiderável de viver no Sol.

Põe o pé e:

mas que chato é o Sol,falso touro

espanhol domado.



Restam outros sistemas fora

do solar a col-

onizar.

Ao acabarem todos

só resta ao homem

(estará equipado?)

a dificílima dangerosíssima viagem

de si a si mesmo:


pôr o pé no chão

do seu coração

experimentar

colonizar
civilizar

humanizar

o homem

descobrindo em suas próprias inexploradas entranhas

a perene, insuspeitada alegria

de con-viver.




Carlos Drummond de Andrade